sábado, 13 de março de 2010

Frederico de Curitiba

Uma vez, quando trabalhava na portaria de um bar em Arica, além é claro de ver zilhões de coisas anormais, tive o prazer de presenciar uma cena muito absurda:

Essa noite teremos um músico, direto de Curitiba para O Barrabás!Frederico, pode entrar!

Ai entra um camarada comprido com uma calça menor que ele, com uns suspensorios frouxos, uma botina Zebu desgastada parecendo que ele atravessou o Atacama a pé, com um óculos de casco de tartaruga, mas que não eram fundos de garrafa pelo menos, só engordurados, mas de lentes finas.Bom, o Frederico, trazia consigo um mini esquife, onde provavelmente ele guardava o violão e os livros de Alquimia dele...

E eu lá, recebendo os convites das pessoas, e abrindo aquela mega porta de castelo que o Barrabás tinha,e pensando comigo:
"Bom, das duas uma, ou ele é muito bom, ou eu espero que ninguem me bata por cobrar esse ingresso pra assistir esse esquisito tocar...".
O Barrabás era, sem duvida, o lugar mais adequado para o Frederico tocar, tinha do lado esquerdo um bar com um toldo enorme em cima, embora fosse um ambiente fechado, tinha um toldo, decerto para as aranhas e moscas mortas não cairem na cabeça dos barmans.No fundo, um telão branco onde geralmente exibiam os piores clipes das melhores bandas, mas até ai tudo bem, ninguem olhava pro telão mesmo, era uma especie de telão mosaico...do lado direito, os banheiros, mas era facil saber que eram lá, bem fácil, super fácil, ao entrar no Barrabás já se podia ter uma noção de onde eram os banheiros.Ao lado tinha uma escada que dava para o mezanino, e onde geralmente ficavam os renegados(as), era lógico, porque uma vez na escada, a multidão te empurrava, para cima ou para baixo, ai era um prato cheio para os mais cabulosos do ambiente poder ter o momento flerte.
Bueno, sei que o Frederico colocou o banquinho no pequeno palco abaixo do telão, tirou um dos lados do suspensório, acho que para não arranhar o violão e mandou:
--"Buenas Noitchês, muito obrigado, agora vamos cantar uma musica muito famosa no Brasil...e....bom é isso ai obrigado e vamos lá."
Começou a cantar Você, do Tim Maia.Sofregamente, ele dizia...



"Nem sei porque voce se foi..."



Eu sabia...porque quem quer que fosse tinha ido...e levado consigo suas taças e objetos de vidro junto, obviamente, para que não se quebrassem com a estridência do Frederico.
3 minutos depois, ele pára, sem nem arranjo de finalização nem nada...

Deu um suspiro, puxou o suspensório pra cima do ombro esquerdo, tomou um gole de piscola e mandou:

--"Buenas noitchês, muito obrigado, é um prazer estar aqui...e é isso, ahn, muito obrigado, agora vamos tocar uma musica tambem muito conhecida no Brasil, ahn, é é isso, e muito obrigado e vamos lá."

Foi nesse momento que eu temi pela vida dele, exatamente quando ele bateu o primeiro acorde e disse:

-"Vou pedir pra você voltar, vou pedir..."

Achei bom que tinham outros brasileiros juntos e alguem gritou:
"Nem fudeeeeendôôÔÔÔ...."Eu entendi, que ninguem voltaria, dificilmente, aliás se encontrassem alguem na contramão iam alertar para não voltar também...e foi nesse momento, al revés de alguns que já saiam emputecidos daquele trem fantasma sem trem, chegaram duas meninas, uma loira e uma morena, brasileiras, bem vestidas, cheirosas e simpáticas:
--Hola.
--Hola.
--Como esta ahy?
--Tá bacana gurias, vamos falar um portuguezinho porque eu já to de saco cheio hoje de cumprimentos castellanos.
--Ahhhn legal, quem tá tocando ai hoje?
--Um cara aí, de Curita, chama Frederico, bom, bom músico.
--Sério?
--Ô.
--Ai que bom que tu gostou, ele é meu irmão.
(Pensei putz, tão bonitinha e irmã do retardado).
--Pois é, taí tocando a galera tá curtindo(pensei em comentar da evasão massiva, das garrafadas no palco, do vômito no banheiro, mas preferi poupa-la)
Entraram no Barrabás, a outra parecia mas não era, brasileira.Canadense isso sim, ela sim é que era feliz, não tava entendendo porra nenhuma.
Ouvi lá de dentro:
--Buenas noitchês, muito obrigado, vamos fazer um breve intervalo, e daqui a pouco voltamos...e muito obrigado.
Eu pensei:"é, tens mais que agradecer mesmo, a eles e a Deus, por não te prenderem por atentado."
Alguns minutos depois, eu já tinha saído da porta, um pouco antes fechou o mau tempo com uns motoqueiros e um pessoal de um bar da esquina, parece que um individuo foi mijar na calçada e acertou os raios de uma moto, aí começou a animação clássica frente ao Barrabás, adorava quando os bêbados da Botellaria Rámon começavam a infernizar os super seletos(pausa pra rir) frequentadores do meu bar.Não vou negar que era bonito de ver os maríachis quebrando violões na cabeça dos skins, os emos chutando os cachorros sarnentos dos pescadores, os pescadores cuspindo nos góticos, os góticos mijando nas gôndolas de Pisco 33° da entrada da botellaria, os emos abraçados chorando, os punks derrubando as motos dos skins, era um versão adulta do Beto Carreiro World, pra mim.

Voltei pra dentro do bar tomando uma dose de J.Daniels, parei no canto da escada, e esperei o "show" começar, literalmente era um show.De horrores.
--Buenas Noitchês, agora vamos tocar uma musica....
Aquela coisa toda e de repente, sem dar tempo do último gole, começou:

--Nem sei porque você se foi...ô mana...beleza?!...quantas saudades eu senti...trouxe meus remédios lá do hotel...e de tristeza...
Eu vou viver, se esse retardado não parar de conversar com a irmã e tocar e cantar ao mesmo tempo.Claro que todos percebemos que não se tratava de um mau músico, e sim de uma patologia, e claro que todos aplaudimos e pedimos bis, afinal, de louco todo mundo tem um pouco, e era injusto deixar que só ele externasse a loucura.

Cantarolou mais umas duas, do Tim Maia também, conversou fiado com as paredes, ficou olhando pro telão atrás dele, meio virado, com os suspensórios caindo, conversou mais um pouco com a irmã pelo microfone, pediu outro piscola, riu sozinho olhando pro toldo em cima do bar, fitou com uma paciência budista os móveis imóveis do mezanino, levantou e alongou as pernas, prendeu os suspensórios, desplugou o violão, desligou a caixa, guardou o violão no esquife entre os livros e uma fênix de pedra sabão e finalmente disse:
--Buenas noitchês, muito obrigado, foi um prazer estar aqui e tocar pra vocês.
Foi aí que eu e o vigia do Bar nos olhamos e esperamos ele sair com a irmã e a canadense para então passarmos a corrente na porta do castelo e irmos pra casa.Era o que faltava.











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Agradeço ao Bocão, por ter me contado essa história de uma maneira muito mais cômica, fazendo-me dobrar de rir entre a máquina de gelo e a copa do Guaruçá.Excelente...

3 comentários:

Aimée Souto. disse...

meu deus, se eu conseguisse parar de rir eu ficaria bem mais calma e com mais certeza que meu comentário terá nexo.
haushaiushaiush.
mas é impossível.
eu fui montando tudo isso na minha cabeça, o lugar, as pessoas, o retardado.
tô morrendo aqui, Paulo, por tua causa.
me matando de rir, e olha que eu tava ajeitando meu material de Imunologia pra estudar, num sábado a noite.
agora não consigo tirar da cabeça a figura que eu imaginei de um retardado cantando Tim Maia e conversando freneticamente com a irmã que acha que ele canta e toca bem, socorro.
coragem!
hauishaiushuahs!
só tu pra me fazer isso!
beijos!

Unknown disse...

daeeeeeeeeeeeeeeeeee paulo que massa irmão gostei muito e o pior e que tem muito mas pra te contar cara mas com certeza vou te mandar mas uns fatos alucinados dessa vida louca ,para voce escrever um grande abraço.

Suarez,Paulo disse...

Valeeeeeeeeeeu Bocão...o verdadeiro dono da estória...me esqueci de partes boas eu acho...mas tái...
Abração e vamos mantendo contato, quando der apareço por Cwb.
Abraçooowww

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